Publicado em 23 de janeiro de 2012 no Blog do Brunocos
*Bruno Moreira
Ele é guitarrista e um dos fundadores do RPM, a maior banda-fenômeno do rock anos 80 no Brasil. Ele é Fernando Deluqui!
Quando começou sua paixão pela música?
Desde cedo... frequentei aulas de bateria antes de completar 10 anos de idade. depois, aos 15, 16, comecei a arranhar um violão que tinha em casa. Comprei minha primeira guitarra, uma strato cor de madeira, bem Blackmore aos 18 e não parei mais.
E como você foi parar no RPM?
Eles me acharam... o (Luiz) Schiavon tocava comigo na banda da Mae East, ex Gang 90 e Absurdettes do Julio Barroso, que já tinha emplacado alguns hits. O Schiavon e o Paulo (Ricardo) já se conheciam desde antes e tinham feito parte de algumas bandas mas não foram projetos viáveis. Com a minha entrada é que assinamos com a CBS e o resto é história.
O RPM foi o maior fenômeno dos anos 80. Do que você mais sente saudades daquela época?
Não sinto saudades de nada. Tento viver o momento da melhor maneira possível e tentando dar o melhor de mim. O Paulo disse outro dia: "Se eu soubesse que envelhecer era bom assim eu teria envelhecido antes". Eu concordo com ele. Claro que tivemos uma fase de muito sucesso naqueles distantes anos 80 (não tão distantes assim) mas estou feliz agora.
O que você acha que levou o RPM ao "primeiro fim", após o sucesso de rádio pirata, em 86?
Éramos jovens demais, fazendo sucesso demais. Nós não tivemos um exemplo para nos servir de referência de como agir no caso de estourar e vender quase 3 milhões de cópias de um disco. Eu, por exemplo, achava que tendo feito aquele sucesso seria fácil fazer de novo, em outro formato, comigo nos vocais, fazendo um som mais rock´n roll, sei lá... Partir para a "carreira solo" é quase uma rotina nas bandas que fazem muito sucesso. Mas o fato é que "fazer sucesso" é uma conjuntura de coisas muito complexa e você precisa estar no lugar certo e na hora certa. Hoje vejo isso como uma coisa divina mesmo. No ano de 86 depois de uma maratona de mais de 500 shows em três anos não tínhamos a menor visão do que estava acontecendo conosco, do cenário musical da época ou da nossa imagem diante do enorme público que havíamos "conquistado". Na minha opinião, deveríamos tirar um ano sabático e voltar depois com muito planejamento e material de qualidade. Deveríamos ter uma estratégia, pessoas nos assessorando e nos dando subsídios para que não jogássemos fora todo aquele sucesso estrondoso que acabávamos de fazer. Em vez disso nos envolvemos numa briga de egos, intolerância, mentiras e nos separamos, ficamos (no pior caso, eu e Schiavon) praticamente 12 anos sem nos falarmos.
Nos anos 90, durante um período, você fez parte do Engenheiros do Hawaii. Foram tempos de turbulência, não?
Sim, foi o período do cd e turnê "Simples de Coração" que durou os anos de 95/96. Foi o período mais caótico da minha vida, pois além de entrar na banda meio a contragosto da própria banda, eu estava me separando da minha primeira mulher. A estória de entrar na banda me foi proposta por Gil Lópes e Carmela que eram empresários nossos (do Paulo e meu) e do João Gilberto também. Quando deixei o que sobrou do RPM em 94 o Gil me ligou e fez a proposta. Adoro o Gil e Carmela e sei que eles não tinham nenhuma má intenção mas o fato é que desde o início, aquilo foi uma confusão muito intensa. O que me era dito por eles, na prática , não acontecia. Detalhes importantes como a formação da nova banda me foram omitidos e os Engenheiros originais que eram o Humberto Gessinger e o Carlos Maltz também estavam com a relação desgastada após muitos anos de banda. A situação era bizarra, com a velha disputa de egos, drogas (eu tava tentando largar mas ainda não tinha conseguido) e rock´n roll. Mesmo assim, o cd estava vendendo bem e a turnê também foi sucesso. Foi uma pena termos parado os trabalhos relativos ao "Simples" tão rápido. Hoje eu tenho consciência de que, de alguns ângulos, a vida pode ser considerada longa e com fases. Na época, em 96, eu estava cansado de brigar e quis partir para um trabalho onde eu tivesse autonomia, tomasse as decisões e não tivesse que brigar para gravar um take de guitarra. Mas o cd tinha qualidade e trabalho com o grande amigo Greg Ladany (Eagles, Fleetwood Mac e Madonna) foi divertido, apesar de tudo e é um dos meus melhores registros da minha carreira. Mesmo assim, deste período, ficou a amizade com o Carlos Maltz e com o Humberto com quem até me encontrei depois.
Qual foi o melhor e o pior momento da sua carreira?
Sobre qual aspecto? Tudo é muito complexo e costumo positivar as coisas e não ficar deprimido. A vida já tá muito chata sem que eu fique me torturando, rs... mas vamos lá... o período do RPM/Radio Pirata foi um grande aprendizado pois eu, que era um surfista desencanado de fazer sucesso no mainstream, de repente fui alçado à fama no seu grau mais alto. Não foi fácil pra mim suportar o assédio. Ao mesmo tempo foi um período mágico e tenho muitas boas lembranças dos shows e coisas engraçadas das viagens. Era um período onde tudo era possível. A maior surpresa ou loucura podia acontecer, não havia limites para o RPMDelux", "Jardim Secreto" e "Fernando Deluqui" foram ótimos do ponto de vista da liberdade que eu tinha para criar e tocar com músicos excelentes. Vários shows foram feitos, onde havia muita improvisação, climas e satisfação musical. A estrutura não era a mesma de um RPM e passei por alguns momentos bem esquisitos, com público barra pesada, sem profissionais de segurança, as vezes, mas fazíamos sons que pagavam um eventual perrengue e eu adoraria continuar a fazer aquele trabalho. Quem sabe um dia, quando o RPM tirar férias...
Como você vê o mercado da música atualmente no Brasil?
Cara, eu sou músico profissional e sei que para pagar as contas com a música você tem que atingir um mínimo de pessoas e isso tem valor. Os jornais falam, na maioria dos casos, da nova sensação do underground dos últimos cinco minutos, mas sei que esses artistas, não raro, fazem pouco show para pouca gente. É ilusão. As FM´s tocam, em sua maioria, o som pop importado das Beyoncés da vida (que eu até acho legal) e o sertanejo que pra mim é um desastre, eu tenho alergia, tipo... não dá mesmo, não sei como nem quem é o responsável por tanta falta de bom gosto. É lamentável mesmo. Fico muito triste, muito triste mesmo com a realidade do mercado. Sei que há muitos talentos e muita música boa sendo desperdiçada. Carreiras geniais foram interrompidas por terem se tornado inviáveis comercialmente falando. Só aqui em São Paulo há bandas como o Cérebro Eletrônico, Ludov, Cabaret, Pedra (to esquecendo um monte) e inúmeras outras que fazem um puta som, mas um puta som mesmo e que ficaram sem espaço. Cara, eu tô falando de uma geração que poderia estar fazendo sucesso, tocando no rádio e fazendo a cabeça de toda uma galera brasileira, mas isso não acontece. É leviano e tem a ver com o enriquecimento rápido de alguns e o consequente emburrecimento (rápido também...rs) de outros. Mas o povo tem o governo (e os artistas) que merece. "Ai se eu te pego..."
Hoje, o que o RPM representa pra você?
O RPM hoje pra mim representa a possibilidade de viver bem e trabalhar com música. Temos a estrutura necessária para viajar, fazer shows, gravar e tudo mais. A nossa equipe técnica também não nos deixa na mão. Mas nossa maneira interna de trabalhar hoje é muito em cima dos moldes do início da banda, quando as decisões eram tomadas pelo Luiz e pelo Paulo. Não é o ideal, pois creio que um pouco mais de democracia tornaria o RPM melhor. As vezes me sinto engessado. E justo eu que sempre tentei fazer tudo certo, tentando entrar em contato com os dois para resolvermos nossos problemas. Não sei o que eu fiz de errado mas é o que temos e não vou parar. Você acha que eu deixaria um outro guitarrista ficar com o meu lugar?
Quais são seus planos pro futuro?
"No plans". Vou tentar tocar guitarra da melhor maneira possível e tentar curtir a vida sem sofrer. A vida é curta.
Para o Fernando Deluqui, a vida é... (?)
Embora eu tenha dito que a vida é curta, eu acho mesmo é que "a vida não é justa mas pode ser boa". Tome cuidado, estude e seja feliz.
O mesmo para você Bruno. Abraços!
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