quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

Trimela! - O Veneno da Valsa [2012]



Em 2010, após algumas jam sessions, a Trilema! surgiu com o intuito de criar apenas música instrumental. Sem se prender a um estilo único e pré-determinado, a banda foi construindo sua identidade através dos improvisos, da livre expressão. Desse fluxo e combinação de ideias, de maneira espontânea nasceram fragmentos musicais que remetiam a um enérgico caos.

É nesse clima que surge o primeiro lançamento da banda, O Veneno da Valsa. Estão presentes nos aproximadamente 40 minutos das 5 faixas desse álbum a heterogeneidade dos estilos musicais identificáveis e os tortuosos caminhos que por vezes se misturam com um clima sombrio e onírico através das dissonâncias. Esses elementos, além de estarem refletidos no processo criativo do conjunto, estão entranhados nas influências do trabalho: a inquietação dos labirintos kafkianos em “Samsa”, a incontrolável e doente dança em “Vitus (Parte I: A Dança, Parte II: A Febre. Parte III: O Fim)”, a obsessão humana em “Me Chamem de Ismael”, a presença do inconsciente demente em “O Homem dos Lobos” e “O Homem dos Ratos”.

Falece Nenê Benvenuti, ex-Incríveis, aos 65 anos

Baixista dos Incríveis, Nenê Benvenuti sai de cena em São Paulo aos 65
Por Mauro Ferreira

Músico que ingressou no grupo Os Incríveis em 1965, ocupando o posto de baixista então vago na banda por conta da saída de Demerval Teixeira Rodrigues, o Neno, Lívio Benvenuti Júnior (1947 - 2013) - conhecido no universo pop brasileiro como Nenê Benvenuti - saiu de cena aos 65 anos na manhã desta quarta-feira, 30 de janeiro de 2013, vítima de complicações decorrentes de um câncer. Nenê morreu em São Paulo (SP). A entrada de Nenê na banda que lhe deu projeção aconteceu no ano em que o grupo, inicialmente batizado The Clevers, passou a adotar o nome os Incríveis, alcançado sucesso durante o apogeu da Jovem Guarda. Nenê toca na gravação do maior sucesso da banda, Era um garoto que como eu amava os Bealtes e os Rolling Stones (Migliacci e Lusini em versão d'Os Incríveis), lançado em compacto editado pela gravadora RCA em julho de 1957. Em 2009, Nenê recordou sua trajetória no universo pop nacional no livro Os incríveis anos 60-70... E eu estava lá, lançado pela editora Novo Século.

domingo, 27 de janeiro de 2013

Zé Ramalho [1978]



Por Zé Ramalho

Este é o meu primeiro disco. O disco de estréia. Veio cheio de misticismo e idéias. Trouxe um linguajar diferente do usual. Através da mensagem do "Avôhai", música que abre o disco, com a participação de Patrick Moraz, tecladista do grupo inglês YES! Além de "Avôhai", traz "Vila do Sossego" e "Chão de Giz", músicas que viraram clássicos da M.P.B. com várias regravações de outros artistas. É o disco da chegada, transpondo a soleira do alcance musical. É um disco que nunca saiu de cartaz. Me orgulho dele e do seu tempo. Foi o início de tudo. Tudo começa com "Avôhai".


Por Marcelo Fróes
Texto da reedição, 2003

Nascido em Brejo do Cruz (PB) a 03/10/49, José Ramalho Neto passou a infância com o avô em Campina Grande e descobriu o rock’n’roll e o iê-lê-iê vivendo a adolescência em João Pessoa, ouvindo tanto a Jovem Guarda quanto os discos dos Beatles e de seus contemporâneos. Na virada dos anos 70, Zé Ramalho foi membro do grupo The Gentlemen, que gravou um álbum pela Rozenblit, mesma gravadora pernambucana por onde o lendário álbum duplo "Paêbirú" foi gravado, em parceria com Lula Côrtes no final de 1974, com participações de Alceu Valença, Zé da Flauta e outros.

Zé Ramalho da Paraíba, como chegou ao Rio em muitas idas e vindas, acompanhou Alceu Valença e chamou atenção. Resolveu estabelecer-se definitivamente na cidade após o carnaval de 1976, disposto a nunca mais voltar para o Nordeste. Aquela altura, já havia composto Avôhai, Vila do Sossego, Chão de Giz e A Dança das Borboletas, e depois de conhecer o produtor Carlos Alberto Sion no pier de Ipanema, entrou no estúdio da Phonogram para gravar uma demo. Não foi aceito, mas passou o ano visitando a RCA, a EMI-Odeon e a Som Livre, que também não se interessaram. O diretor de TV Augusto César Vanucci tornou-se fã e mostrou Avôhai à então esposa Vanusa, que decidiu gravar a música em São Paulo, com Zé ao violão.

Já perto daquele ano de 1976, Raimundo Fagner deu seu aval junto à diretoria da CBS - chamando atenção para o trabalho do amigo, o que fez com que o diretor artístico Jairo Pires se encantasse ao ouvir Avôhai. Imediatamente contratado no início de 1977, Zé Ramalho respirou aliviado e passou o ano fazendo shows no Rio. Uma versão de Avôhai chegou a ser registrada num estúdio de rádio, para que entrasse imediatamente na programação. Este primeiro disco solo de Zé Ramalho foi gravado em 8 canais no estúdio da CBS em novembro de 1977.

Todos os músicos tocaram de graça, animados com a oportunidade alcançada pelo cantor e compositor paraibano, inclusive o tecladista inglês Patrick Moraz, que estava gravando um álbum solo no Rio de Janeiro.

As bases foram gravadas com poucos músicos, tendo Zé até mesmo, usado apenas percussão e não bateria neste trabalho semi-acústico de incrível qualidade sonora. Também na parte eletrificada, o ex-Mutantes Sérgio Dias sensibilizou tanto por sua participação que ganhou três dos oito canais para seu apoteótico solo de guitarra em A Dança das Borboletas. Ninguém percebeu na ocasião que a fita estava chegando ao fim, e é por isso esta faixa encerra o primeiro lado do disco daquela forma.

Como o artista continuava morando num quarto alugado na Glória, a CBS decidiu hospedá-lo no Hotel Plaza de Copacabana para que fizesse o trabalho de divulgação com mais conforto. O disco teve ótima repercussão e o artista aproveitava para distribuir seu livrinho de cordel Apocalypse na entrada de seus shows. Zé Ramalho sentiu que a "coisa estava começando a acontecer" em meados de 1978, quando recebeu o primeiro dinheiro proveniente da execução pública de suas músicas.

*reedição de 2003

sábado, 26 de janeiro de 2013

Álibi de Orfeu - Só Veneno [2010]

Mega 320kbps

Banda Álibi de Orfeu lança álbum “Só Veneno”
Publicando em 28 de abril de 2010 no Diário do Pará

A alcunha de independente, quando ligado à música, é sinônimo de muita ralação, principalmente para formalizar o trabalho, em forma de disco. Isso significa uma verdadeira corrida atrás de recursos para custear desde a produção até a prensagem do CD. Justamente por conta disso, a banda paraense Álibi de Orfeu lança hoje, depois de mais de três anos do pré-lançamento, o disco “Só Veneno” (Ná Music). De 2007 pra cá, muito trabalho. Ajustes sonoros, parcerias e corrida em busca de patrocínios foram basicamente as atividades que os integrantes fizeram nesse tempão. E, no final, tudo saiu como eles queriam.

A vocalista Gláfira Lobo conta que não é nada fácil fazer um disco redondinho e botar nas prateleiras. Tem que ter muita paciência e aguardar. “São várias etapas para que um disco fique pronto até o lançamento. Só a gravação não garante que ele vai sair”, conta. Ela diz que muitos recursos para a pós-produção dependiam de recursos extras. “Demoramos por falta de patrocínio. Até que encontramos as empresas que nos apoiaram. Essa é a realidade da música independente na Amazônia”, diz.

Mas eles não reclamam do tempo. “Ficou melhor do que imaginávamos”, conta a vocalista e compositora. A espera serviu ainda para refinar as parcerias. No novo disco, a faixa título conta com a parceria de Frejat nas guitarras. A velha intimidade com Edgar Scandurra, ex-“Ira!”, também permaneceu na produção deste último CD. “Mas desta vez ele quis também cantar e tocar e ainda gravou solo”, revela Gláfira.

A sonoridade de “Só Veneno” não tem, porém, lembranças das notas oitentistas, já desgastadas, apesar de essa ser a principal vertente musical no disco. A vocalista garante que, para se reinventar, não tem muito mistério. “A música se recicla automaticamente. Os integrantes da banda ajudam para isso também. Cada um tem uma referência musical mais forte e isso está presente nas composições da banda”, conta.

sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

Kaizen - Gargula [1994]

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Este grupo instrumental, formado em 92, foi uma iniciativa do virtuoso violinista Kleber Vogel, que havia deixado o Quaterna Réquiem e desejava seguir em frente com uma proposta progressiva… e resolveu partir de uma idéia que estava embutida no nome escolhido… Kaizen… um conceito japonês que significa “o constante aprimorar do trabalho”.

Violinista de formação clássica, Kleber Vogel participou da Orquestra Sinfônica Brasileira, e também da Filarmônica do Rio de Janeiro, além da Orquestra de Câmara da da Universidade Federal do Rio de Janeiro… atividades que o orientaram em direção do lado mais sinfônico do progressivo… o que é sensível no único registro de estúdio do Kaizen, o álbum “Gargula” de 94.

Kleber voltaria para o Quaterna Réquiem em 2002, e lançaria em 2003 o álbum “À Mão Livre”, com a tecladista Elisa Wiermann… e ele também participaria do show de comemoração dos 15 anos do grupo, em agosto de 2004 no Centro Cultural Justiça Federal, no Rio de Janeiro, que seria registrado no DVD Quaterna Réquiem, lançado em 2006… mas nós vamos fechar com faixas do seu projeto de vida curta dos anos 90… o grupo Kaizen.

sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

Lestics - Aos Abutres [2010]

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Por Jéssica Gabrielle L.

"Você quer se salvar e segue adiante/ Mas o céu jamais esteve tão distante". É assim que o primeiro refrão reverbera as ótimas 11 canções do quarto disco da banda paulistana Lestics, Aos Abutres . Libertos de amarras e rótulos que poderiam muito bem destoar e até mesmo estragar a naturalidade que a banda transborda. Tem gente que diz que os caras são folks. Eu acho que são muito bons - assim, sem dizer de que partido fazem parte. Lestics é um daqueles grupos que fazem a diferença na cena brasileira atual, assim acredito. Em meio a tantos wannabes e pretensiosos, os caras fazem um som bonito e sincero.

Posso estar enganada, mas Aos Abutres é um disco feito por apaixonados, com letras de amor, seus tropeços e sutilidades que sempre fazem inflar o peito de quem tem um alguém (ou não) para compartilhar os mais diversos momentos, "Parto Normal" dita bem isso. Vivemos de rotina e se não soubermos sair um pouinho dela a vida nos engole. Acho que podemos reparar isso em "Elevação". Muitas vezes é preciso deixar pra trás nosso orgulho e rancores pra poder seguir em frente. Não, não é um texto nem disco de auto-ajuda, mas das coisas cotidianas, que esquecemos todo o tempo de enxergá-las.

Tim Maia [1971]

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Por Marcelo Cruz no Sacundinbenblog

1971 é o que considero: "O" ano dos álbuns mais "violentos" da música brasileira, no bom sentido é claro. Tim Maia, com seu segundo álbum, contribuiu para engrossar ainda mais o caldo entrando de sola e emplacando no mínimo dois sucessos que sem saber tornariam-se clássicos absolutos, "Não quero dinheiro (Só quero amar)" e "Você".

Além dessas, Tim gravou para o volume sua versão de "Não Vou Ficar", gravada anteriormente por Roberto Carlos, seria lindo/perfeito se pusessem a voz de Tim no arranjo de Roberto, esse também é bom, mas prefiro o outro. Outra que já era conhecida e que Tim regravou foi "Meu País", lançada em compacto 3 anos antes (1968).

Agora vamos para as menos conhecidas ou desconhecidas que mais gosto. O volume abre com "A Festa De Santo Reis", excelente! Depois temos outra nos moldes de "Coroné Antônio Bento", aquela que está no primeiro disco, o funk-baião "Salve Nossa Senhora", depois uma das que mais gosto, a suingada e genial "Um Dia Eu Chego Lá" e pra fechar as desconhecidas a "deliciosa" (rsrsrs) "É Por Você Que Eu Vivo".

Nesse álbum vemos o primeiro flerte de Tim com a Bossa Nova, flerte que Tim assumiria totalmente na década de 90, na inigualável versão de "Preciso Aprender a Ser Só", composição de Marcos e Paulo Sérgio Valle.

domingo, 13 de janeiro de 2013

Entrevista com Leoni, 11/01/2013

O músico Leoni conta como a internet transformou o seu modo de encarar a cultura, a política e sua própria carreira

Por Pedro Alexandre Sanches
publicado em 11 de janeiro de 2013 na revista Forum

“É uma briga solitária, e uma briga inclusive com os artistas, aqueles que reclamam: ‘O mundo acabou’, ‘a internet veio pra foder com a gente’. Não, não, espera aí, sem internet é que a gente estava fodido! Os privilégios são só para quem está em gravadora, o resto vive em exílio artístico.” O confronto se dá entre o carioca Carlos Leoni Rodrigues Siqueira Jr., conhecido artisticamente como Leoni, e seus colegas de música popular brasileira. Ele discorda de seus pares alocados nas estruturas obscuras do Ecad, o Escritório Central de Arrecadação e Distribuição de Direitos Autorais, e é dos poucos que gosta de afirmá-lo publicamente.

Leoni é coautor de um número expressivo de sucessos pop da década de 1980: “Pintura íntima”, “Por que não eu?”, “Como eu quero” “Fixação”, “Nada tanto assim”, “Lágrimas e chuva”, “Garotos”, “A fórmula do amor”, “Exagerado”, “Só pro meu prazer”, “Nosferatu”. Diz receber bem do Ecad. Mesmo assim, passadas as febres de juventude, trilhou rumos contrários aos da elite dos artistas de sua idade ou mais velhos, e fez da internet sua casa, empresa, ágora, palco, palanque.

“As pessoas só reclamam: ‘Tem que cobrar por tudo’, ‘estamos sendo roubados’. Não, não, não, gente, não é isso. Quem estamos sendo roubados? As corporações, as gravadoras, esses sim estão perdendo. Os artistas, não, até porque tem cada vez menos gravadora lançando cada vez menos gente. Deve ter uns 20 ou 30 privilegiados que podem perder alguma coisa. Todo o resto da cultura brasileira ficava alijado nem de fazer muito sucesso, mas de ter uma carreira.” Agora não é mais assim, ele afirma.

É uma história de muitas idas e voltas. Aos 21 anos, com a banda Kid Abelha & Os Abóboras Selvagens (mais tarde simplesmente Kid Abelha), Leoni virou reizinho das paradas nacionais de sucesso. Com a então namorada Paula Toller e companhia, cravou dois discos cheios de hits pop-rock, Seu espião (1984) e Educação sentimental (1985), numa época congestionada de autores de hits pop-rock: Blitz, Lulu Santos, Marina Lima, Ritchie, Neusinha Brizola, Os Paralamas do Sucesso, Legião Urbana, Ultraje a Rigor, RPM…

A presença de Leoni no Kid acabou com uma pandeirada imprimida por Paula na face do ex-namorado, fórmula de ódio encontrada nos bastidores enquanto no palco o grupo buscava “A fórmula do amor” (1985). A historinha banal era daquelas que entram para a mitologia do pop. “Acho pitoresca, folclórica”, ele ri. “É bacana ter uma história que esteja na história da música brasileira, mesmo puxada para o ridículo.”

Daí em diante, Leoni seguiu com uma segunda banda, Heróis da Resistência. Assim como a primeira, não era mimada pela crítica musical que, via de regra, fazia o contrapeso do sucesso avassalador dos artistas e bandas destinados mais a produzir bagunça e diversão do que a fazer cabeças. “Nem o Kid Abelha foi aceito no início. Depois, com o tempo, é que as pessoas começaram a falar bem. Na época foi escorraçado, era muito malvisto, o ‘rock de bermuda’. Foi muito ruim de lidar, muito ruim mesmo. Eu era fã de música, não da fama. Queria ter boas críticas.” Não conseguiu pular os muros de preconceitos e efeitos-manada nem no Kid, nem nos Heróis, talvez nem na carreira solo que desenvolve, com entressafras, desde 1993.

Logo na estreia, os Heróis erigiram um hit-chiclete do tamanho dos do Kid, “Só pro meu prazer” (1986). “Noite e dia se completam/ o nosso amor e ódio eterno/ eu te imagino, eu te conserto/ eu faço a cena que eu quiser”, gotejavam versos aparentemente melosos sobre melodia amorosa. Aos 51 anos, o autor tem uma leitura peculiar de sua própria canção: “Tem um lado irônico muito forte, que pouca gente percebe. Acham que é uma canção de amor rasgada, e é muito cruel, de reformular o outro, ‘você é uma merda do jeito que é’, ‘vou te fazer só pro meu prazer’, ‘seus prazeres e sonhos não vêm ao caso’. Não é uma música de amor. Dizem: ‘É a música do meu relacionamento’, caramba!”, diverte-se, lembrando que “Só pro meu prazer” foi regravada em clave sertaneja por Bruno & Marrone. “As pessoas não se tocam da ironia, ou então acham natural: ‘Vou ajudar essa pessoa a ser melhor’. Não percebem que é uma coisa fascista.”

Talvez “Só pro meu prazer” batesse bem por retratar um tipo de amor vivido por muitos, talvez também um estado espírito da própria indústria de entretenimento em que ele se inseria. “Sem querer, nossa geração foi responsável pela primeira grande monomania no mercado musical brasileiro. Antes as pessoas faziam sucesso, mas não era excludente. Todo mundo tinha seu espacinho no rádio. Quando estouramos, todos os programas de TV e rádio só tocavam rock. Vender 200 mil era bom pra caramba, e vender 100 mil já era muito mais do que a geração MPB vendia antes da gente. Quando entrei na Warner, as carreiras super bem-sucedidas de Guilherme Arantes, Milton Nascimento, Caetano Veloso vendiam 30 mil, 40 mil. A gente vendia muito mais.”

Maduro, Leoni percebe o que não era inteligível no calor da hora. “As gravadoras acharam legal, porque a gente vendia muito e não custava caro. Não tinha que contratar orquestra, arranjador, músicos. Era bem mais econômico. Só que, então, eles descobriram que existiam outras manias mais lucrativas – axé, pagode, lambada, sertanejo. Por que iam ficar aqui vendendo 100 mil se os novos vendiam 3 milhões? A gente acabou sendo vítima do sucesso que fez.”

A memória de Leoni percorre o antes e o depois dessa transição – e a percepção de seus significados. Sobre a primeira fase, interpreta: “É muito difícil lidar com o sucesso. Em 1982, eu tinha 21 anos e já tinha uma carreira, dinheiro. De repente, parece que você tem direito divino ao sucesso, que aquilo nunca vai acabar, que você descobriu a fórmula. A gente ficou se sentindo importante demais. Caímos de paraquedas, não tínhamos a menor noção se estávamos sendo explorados ou não, ou do que vinha depois”.

Sobre o rescaldo, com os Heróis, também vai direto ao ponto. “Em 1988, fomos gravar o segundo disco em Los Angeles com [o produtor e ex-integrante dos Mutantes] Liminha. Esse foi um fiasco absurdo, porque além de as músicas não serem muito boas pra rádio, a gente gastou uma fortuna. Eu me lembro de o [diretor da Warner] André Midani ir para lá tentar controlar nossos gastos. Liminha estava amarradão, na Disneylândia. Quer aquela guitarra verde de 12 cordas às duas horas da manhã de segunda pra terça? Basta ligar que aparece.”

O álbum, Religio, deu em nada. “Tínhamos gasto junto com a gravação o dinheiro da divulgação, então o disco foi pro saco. Só depois de vender 100 mil voltariam a pensar em gastar com o disco, mas, se não divulga, não vende 100 mil. Vendeu 20 mil. A gente ficou com uma dívida dentro da gravadora, e o terceiro disco, em 1990, foi feito em condições infinitamente piores. Não tinha o dinheiro da gravadora, o jabá, para investir e fazer tocar. O desinteresse da gravadora era total, e ficamos sem contrato numa época em que ninguém mais queria banda de rock”. A febre de juventude virava vida real para os garotos de “Garotos”, enquanto as gravadoras procuravam as próximas galinhas de ovos dourados.

A ascensão, a queda. E a internet

O primeiro álbum solo, chamado simplesmente Leoni (1993), veio por outra multinacional (a EMI), com um sucesso, a tristonha “Garotos II – O outro lado” (“garotos não resistem aos seus mistérios/ garotos nunca dizem não”), e uma reflexão precoce sobre o drama que se desenrolava nos bastidores, no reggae “Carro e grana”: “Já tive carro e grana e um monte de convites pra qualquer lugar/ hoje eu só ando a pé/ mas eu continuo a andar”.

Leoni reavalia “Carro e grana”. “É a percepção de que o fracasso, ou pelo menos o não sucesso, é também muito importante para você entender em que mundo está vivendo. As pessoas não conseguem manter o sucesso pra sempre, não é assim. Eu ainda era muito iludido com o sistema, achava que com o sucesso de ‘Garotos II’ estava feito, pronto, acabou, como tinha acontecido com o Kid Abelha antes. Comigo não aconteceu. ‘Garotos II’ tocou muito, mas o disco não vendeu bem. Na hora de gravar o segundo, a gravadora não teve interesse, e ninguém mais tinha interesse em mim, porque se espalhou uma fama de que eu tocava bem, mas não vendia.”

Essa história poderia acabar assim, qual uma fábula moral(ista) de ascensão e queda. Mas aí aconteceu a internet.

Fora um single com a lúcida “Tudo sobre amor e perda” (1996), Leoni não lançou mais nada entre 1993 e 2002. “O que fiz mais nessa época foram dívidas.” Em 2002, bancou Você sabe o que eu quero dizer por uma gravadora pequena. “Os meios pra divulgar eram os mesmos: jornal, revista, televisão, rádio. Eu não tinha grana pra participar do jogo nem estômago pra fazer jabá. Então não tocava.” No ano seguinte, a Som Livre, gravadora da Globo, adequou Leoni ao formato em voga de regravar sucessos em roupagens acústicas, intimistas, com participações especiais de outros ídolos mais ou menos caídos de sua geração.

“A Som Livre anunciava o Áudio-Retrato em lugares que têm TV com parabólica, e começou a rolar muito pedido de show no interior. Era guerrilha mesmo, íamos eu, um guitarrista e um produtor, sem técnico nem roadie, a gente montava e desmontava. Foi nessa época que comecei a usar muito a internet”, lembra.

Enquanto os colegas mais conservadores viam – ainda veem – a internet como um inimigo ameaçador, o ex-garoto inconsequente encontrou ali a janela de oportunidade de que precisava para… bem, para continuar trabalhando, talvez mais e mais pesadamente do que nunca. “Eu tinha que criar algum tipo de contato direto com o público, o que era a minha aflição. Sabia que tinha gente que gostava do meu trabalho, mas eles não sabiam que eu tinha lançado um trabalho. Foi em 2004 que entrei no Orkut, vi que tinha uma comunidadezinha que falava de mim, entrei e comecei a conversar com aquelas pessoas. Em 2006, lancei meu segundo independente, junto com o site, um dos primeiros que tinham uma rede dentro, um fórum de discussão. Ainda tem, mas hoje as pessoas discutem mais no Facebook. Passei a focar inteiramente em ser independente, cuidar de internet e show. Esquece rádio e TV, o que tiver disso é lucro, mas não dá pra eu entrar na briga.”

O novo organismo aprendeu a organizar o próprio metabolismo, devagar e sempre. Leoni inventou de lançar singles virtuais mensais, para manter os fãs abastecidos e os próprios desejos criativos alimentados. Entregou sua obra para os admiradores consumirem livremente, de graça. “Os colegas, principalmente os que estão ligados às diretorias das sociedades arrecadadoras, acham uma estupidez. O [produtor musical] Mazzola falou diretamente para mim: ‘Pessoas como o Leoni, que dão músicas na internet, vão perceber que deram um tiro no pé’. Isso não aconteceu, nem vai acontecer, até porque as pessoas cada vez menos precisam comprar ou mesmo baixar música. Ouvem no YouTube”, afirma.

Ele retribui tais críticas com outras críticas, endereçadas àqueles artistas que, por exemplo, terceirizam a própria presença nas redes sociais. “Se o artista está no Twitter e segue todo mundo, que é normalmente a estratégia desse pessoal, o fã sabe que não é especial. Está sendo seguido porque todo mundo está sendo seguido. A internet não é um monólogo, é uma conversa. Se você não faz a sua parte, você aproveita pouco. Pra mim, é muito importante saber o que as pessoas estão achando, ouvir a opinião delas, colocá-las pra produzir e apresentar o que elas fazem também.”

A descoberta dessas ferramentas transformou o modo de encarar cultura, política e vida do coautor de versos gostosos como “diz pra eu ficar muda, faz cara de mistério/ tira essa bermuda que eu quero você sério/ dramas do sucesso, mundo particular/ solos de guitarra não vão me conquistar”. “O que começou como uma estratégia de sobrevivência acabou me ensinando muito sobre cultura, sobre compartilhamento. O que era uma simples posição de negócio virou posição política”, diz.

A politização, assombração das indústrias de outrora, passou a entrar na nova composição: “Com essa coisa neoliberal, a gente tinha perdido a ágora, o local público onde a gente poderia discutir com alguma eficácia para mudar as coisas. Com a internet, a possibilidade de mobilização, ser engajado passou a ser outra coisa. Você pode realmente fazer alguma diferença”.

Munido das novas descobertas, ele transforma rascunho em arte-final. “A gente viveu uma época em que os artistas eram escassos, porque não tinha como não ser. A capacidade das gravadoras de lançar discos era escassa, e o resto estava fora da história. Essa escassez fez com que tanto o público quanto os artistas tivessem uma noção meio de casta, de eleitos. ‘Somos especiais’, ‘somos muito doidos’, ‘podemos fazer o que queremos porque somos artistas’. Com a internet, de repente todo mundo é artista, não tem casta nenhuma. Acho que esse é um privilégio ainda mais complicado de os artistas abrirem mão. ‘Eu não vou competir com esse cara, sou um artista, quem é ele?’. Mas, antes de você ser artista, você não era, era igual a ele. São muitos preconceitos, muito elitismo que os próprios artistas têm.”

O vetor resultante se aproxima do oposto simétrico do tempo em que a indústria dispunha de nós – consumidores, críticos, artistas – só para o seu prazer (ou lucro). “Hoje em dia, tenho um contato com o público que nunca imaginei que fosse ter, e uma liberdade artística que não teria em época nenhuma. Não tenho de agradar a nenhum diretor artístico ou de rádio. Isso me deu uma liberdade de criação e de pensamento que eu nunca tive.” Diz que seu público cativo, quando instado a ajudar a selecionar o repertório de um show, costuma eleger canções mais novas, que entoam em coro na plateia. “Pelo pensamento tradicional da indústria, isso não teria como acontecer.”

Mais que militante pelos downloads gratuitos, Leoni virou um militante político-cultural, daqueles de reivindicar por sua categoria no Congresso Nacional e participar ativamente da CPI do Ecad – mesmo que o escritório continue a remunerá-lo razoavelmente. Suas diferenças com a instituição são menos particulares que coletivas. “Um dos casos que mais me revoltou foi o de uma escola pública do interior que ia fazer uma festa junina, e o Ecad foi lá pra cobrar os direitos autorais do Luiz Gonzaga”, exemplifica. “Como não tinha dinheiro, a escola teve que cancelar a festa. Quem ganhou com isso? Os herdeiros do Luiz Gonzaga com certeza não, porque não receberam dinheiro. A cultura brasileira também não, porque ninguém ouviu as músicas do Luiz Gonzaga. As crianças também não. O direito autoral é usado como uma forma de exclusão social. E as pessoas acham que não, ‘é o meu direito’, ‘direito adquirido’. Ora, todo direito é adquirido, não existe direito natural.”

Poucos garotos sabem bem como Leoni as dessemelhanças entre direitos naturais e adquiridos. Ele os quer, mas prefere dividi-los conosco. E ainda existe quem chame o que ele faz de “tiro no pé”.

sábado, 12 de janeiro de 2013

Quaterna Réquiem - O Arquiteto [2012]



Por Marcos Oliveira

Comandada pela professora de música erudita e mestre nos teclados Elisa Wiermann e por seu irmão artista plástico (pintor) e baterista Cláudio Dantas (nas duas atividades um dos melhores do país), o QR está lançando esta semana o seu terceiro disco de estúdio, que levou anos para ser gerado. Completam a banda: Kleber Vogel, violino; Roberto Crivano, guitarra e Jorge Mathias, baixo.

Trata-se de trabalho conceitual abordando os maiores arquitetos do mundo. Cada tema remete a um grande nome que são inspiração para a suíte, de países e estilos de época diferentes: Itália - Renascença, França - Barroco/Classicismo, EUA - Modernismo, Espanha - Romantismo e Brasil - Modernismo/Contemporâneo.

Oscar Niemeyer ouviu e deu seu depoimento (de grande valia, não é mesmo?): "Além de agradecido pela gentileza de uma faixa musical dedicada a mim, constatei que o CD "O Arquiteto" lançado pelo grupo musical Quaterna Réquiem mostra a capacidade de suas músicas em ver e sentir a arquitetura do mesmo modo que sua própria música. Um projeto da mais alta qualidade e conteúdo artístico, que muito me agradou."

Veja também:
Quaterna Requiém - Quasímodo [1994]
Quaterna Réquiem - Velha Gravura [1992]

sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

Sagrado Coração da Terra - A Leste do Sol, Oeste da Lua [2000]



Download 320kbps


Quinto CD do Sagrado Coração da Terra que traz sucessos de Marcus Viana para a TV, novas músicas da banda e uma versão pop-sinfônica da música "Terra" de Caetano Veloso. Participação de antigos integrantes do Sagrado, membros de bandas de rock progressivo como Dogma e Saecula Saeculorum e de André Matos, ex-vocalista do Shaman.

sábado, 5 de janeiro de 2013

Algaravia - Breve e Interminável [1996]

Mega .flac


Por Bilkaim em Prog Archives

Se King Crimson tivesse feito este álbum, teria sido elogiada como um dos seus melhores nos últimos anos. Definitivamente. Mas desde que foi emitido por uma banda desconhecida de rock progressivo do Brasil, ele será reconhecido apenas por um pequeno grupo de pessoas que tiveram a sorte de prestar atenção suficiente ao seu conteúdo. Minha primeira impressão depois de ouvir foi positiva, mas longe de ter vontade de repetir a escuta. De alguma forma, eu escutei uma vez mais com meus amigos e todos nós concordamos que o álbum está longe de ser apenas um bom álbum de rock prog. A partir desse momento eu voltava para o álbum como, possivelmente, a mais agradável surpresa em um último par de meses. A música é triste o suficiente para atrair os fãs de Anekdoten mas também dinâmica e alerta para ser aceitável para aqueles que preferem Al Di Meola e RTF. Mais de 75 minutos de virtuosismo musical com desenvolvimentos complexos do tema e humor. Especial atenção deve ser dada ao trabalho de guitarra de Sidney Jaires e fundo de percussão do grande Vladimir Ricardo. Breve e Interminável não deve ser o último esforço de Algaravia.