Quarto álbum de estúdio do grupo sergipano The Baggios, Vulcão irrompeu esta semana no mercado fonográfico brasileiro com a voz da cantora Céu na música Bem-te-vi e o toque da banda Baiana System na faixa Deserto.
Parceria de Russo Passapusso com Júlio Andrade, vocalista e guitarrista do grupo de blues-rock, Deserto é a única das onze composições do álbum Vulcão que tem duas assinaturas. As outras dez são criação da lavra solitária de Júlio Andrade, artista que criou o The Baggios em 2004 na cidade de São Cristóvão (SE).
De 2008 a 2016, The Baggios foi essencialmente um duo centrado na interação de Júlio com o baterista Gabriel Carvalho, que se firmou no posto pelo qual já tinham passado os bateristas Lucas Goo (de 2004 a 2006) e Elvis Boamorte (de 2006 e 2008).
Em Vulcão, Rafael Ramos (piano, órgão e baixo) já aparece efetivado na banda, inclusive nas fotos promocionais, após ter atuado como músico convidado do álbum anterior dos Baggios, Brutown (2016).
Brutown foi lançado há dois anos pelo mesmo selo da banda, Toca Discos, que ora edita Vulcão, álbum que conecta o The Baggios aos sons da África e a ritmos do Brasil com o nordestino baião.
Com toque psicodélico e levadas orientais na música Vermelho rubi, o álbum Vulcão versa sobre a intolerância religiosa em Louva-a-Deus e joga a dicotomia yin-yang no Caldeirão das bruxas.
Já Limaia liquidifica ritmos de manifestações folclóricas de Sergipe como a Marujada, o Reisado e a Caceteira. Os afrobeats atravessam o disco, gravado no estúdio Toca do Bandido, na cidade do Rio de Janeiro (RJ), com produção orquestrada pelo mentor Júlio Andrade.
1 - Louva-a-Deus
2 Caldeirão das Bruxas
3 - Deserto (part. Baiana System)
4 - Espada de São Jorge
5 - Em Si Menor
6 - Vermelho-Rubi
7 - Samsara
8 - Limaia
9 - Fera
10 - Bem-Te-Vi (part. Céu)
11- Vulcão
Há discos que precisamos escrever sobre. Há outros que sentimos a necessidade de gritar ao mundo sua existência - que toca o coração, alerta os ouvidos e arrepia a alma. Brutown é desses de compartilhamento obrigatório. Disco que dá vontade de mostrar aos amigos, dar de presente à namorada e ouvir bem alto com a janela aberta para acordar os vizinhos.
Considerando a discografia do The Baggios, podemos dizer que 'Brutown' é um salto ornamental na carreira dos caras. Esqueçam aqueles dois rapazes fazendo rock and roll hendrixiniano, crú e impiedoso. Aqui nasce outra banda. A expansão musical é violenta e igualmente divina. E sua encarnação aconteceu no cultuado estúdio Toca do Bandido, no Rio de Janeiro, pelas mãos de Felipe Rodarte.
Tal crescimento sonoro é evidente e pode ser conferido logo na faixa de abertura, "Estigma" - rock estiloso e cheio de metais, que lembra Jack White e conta com a bela participação de Emmily Barreto da Far From Alaska. A ótima "Brutown", faixa que leva o nome do disco, segue o mesmo caminho de rock refinado, só que imersa no rock setentista e de teclados à la Deep Purple. Já "Desapracatado" ganha a roupagem retrô dos Autoramas, numa participação da dupla Gabriel Thomaz e Érika Martins. Essa é apenas mais uma das várias participações especiais do disco. Outra que também merece destaque é "Saruê", que traz a voz inconfundível de Jorge Du Peixe da Nação Zumbi.
Mas o que realmente define a riqueza artística de 'Brutown' é o seu Know-how para manter uma inabalável brasilidade mesmo quando as referências são das mais variadas. Ouça "Sangue e Lama", de levada blues e letra que retrata o nosso atual cenário ganancioso e intolerante. "Bebem da lama que já foi rio", canta Júlio, com sotaque à combinar com o tema. "Padece Ser" representa a luta do povo humilde num rock de primeiríssimo nível. Mas a melhor de todas é "Alex San Drino", que resume toda a categoria do novo The Baggios em cima dos palcos - agora com um tecladista.
Candidato a disco de rock do ano, 'Brutown' é sangue, suor e lágrimas. Tem o talento musical do - agora - trio Julio / Gabriel / Rafael exposto de uma forma lapidada, com uma produção de estúdio habilidosa. Além disso, o feeling permanece gritante em todas as faixas. Como dito anteriormente, é trabalho que merece epidemia, principalmente por retratar tão bem o rock brasileiro - esse mesmo que alguns medalhões teimam em dizer que morreu nos anos oitenta. Destaque também para a lindíssima capa do disco, assinada por Neilton Carvalho. Essencial em qualquer esfera!
Um dos destaques da cena independente do rock brasileiro, a banda sergipana The Baggios, lançou no último dia 13 de maio, o DVD que registra o show comemorativo de seus 10 anos de estrada. E algo para se refletir é o fato de bandas, com a consistência do The Baggios, estarem virando uma década de carreira, enquanto muita gente ligada em rock e música brasileira continua a insistir na tecla de que nada de bom tem rolado de novo na música brasileira.
Como eles, vários trabalhos legais vão virando década contando com o respeito da crítica e de segmentos mais restritos de público, sem que uma parte do público “alternativo” se dê conta da dinâmica e qualidade do cenário brasileiro contemporâneo. Isso pode parecer natural num contexto de mercado como o atual, porém, não deixa de ser constrangedor o fato que mesmo uma parcela significativa do público que cultiva gostos na contra-corrente do mercadão, continue a alimentar a idéia de que fora dos clássicos do passado não há salvação.
Confira o trailer do DVD
The Baggios são uma das muitas bandas que estão por aí provando o contrário. De que forma? Praticando uma música consistente que consegue unir, contemporaneidade e tradição, produzindo um som que, ao mesmo tempo soa instigante e novo, mas sem ocultar ecos de influências bem digeridas de fontes clássicas como o blues, Jimi Hendrix, Led Zeppelin, Raul Seixas, Alceu Valença e outras fontes da música nordestina. Sua auto definição: “um duo barulhento de blues rock”.
Outro ponto central é a competência musical que amarra e filtra essas referências e dá ao grupo uma identidade própria inconfundível. Consistência essa que permite ao duo construir um som poderoso apenas com guitarra e bateria na maior parte do tempo, com eventuais participações que dão uma cor diferente e uma dinâmica ao longo dos seus álbuns.
“Dez Anos Depois”
Com o título de “Dez Anos Depois” estampado na capa feita por Camila Vasconcelos, o CD/DVD registra o primeiro show da turnê que passou por mais 30 cidades brasileiras. Realizado no Teatro Atheneu , para cerca de 700 pessoas, o show, apresenta 22 músicas das várias fazes do Baggios, fazendo um apanhado da trajetória do grupo, reunindo também todos os ex-integrantes que passaram pela banda em suas diferentes formações além dos músicos que participaram de seu mais recente trabalho de estúdio, o elogiado álbum “Sina”.
Como conta o guitarrista: “Em 2001, com 15 anos vividos, pluguei pela primeira vez uma guitarra em público, na porta do Teatro Atheneu, na ocasião, um pequeno evento clandestino. Não imaginava que poucos anos depois eu montaria outra banda de rock em Sergipe que pudesse alcançar 10 anos de atividades, três Ep´s e dois álbuns lançados, várias turnês pelo país, e ter me enchido de experiência de vida através da música. A simbologia dessa década com o The Baggios chega a seu momento mágico, onde dessa vez, pude tocar no palco do teatro, o que fecharia esse ciclo”.
Guitarrista fundador e remanescente de todas as formações do Baggios, Júlio Andrade partiu da escola do punk e aos poucos foi descobrindo o rock sessentista e o blues e incorporando novas técnicas, inclusive para formatar uma linguagem apropriada ao som compacto e coeso do grupo.
Sina
Ponto de maturidade dentro da trajetória da banda, o elogiado álbum “Sina”, dá a tônica do DVD. Quanto às canções, tendo sido formado na cidade histórica de São Cristóvão, Sergipe, o The Baggios, tem parte de suas letras inspiradas em personagens reais de sua terra natal, a começar pelo próprio personagem que dá nome ao grupo, Baggio, um músico andarilho que circulava pela cidade desde a infância dos roqueiros e que com o tempo descobriram se tratar de um músico que chegou a batalhar, sem sucesso, a vida como músico profissional em grandes centros do país. O resultado foi um álbum quase conceitual, que revela o caráter universal de todo cenário regional.
A sonoridade, por sua vez, inclui boas doses de experimentação em arranjos precisos e composições mais maduras. A base se mantém centrada no blues e no rock, mas se permite incorporar outras influências rítmicas como xote, funky, afrobeat e folk. Gravado em Aracaju e masterizado em Seattle, o disco foi lançado em vinil com excelente repercussão, tendo sido incluído em 25 listas de melhores discos do ano, além de ter a música “Sem Condição” eleita como uma das 25 melhores músicas de 2013 pela revista “Rolling Stone”.
The Baggios e orquestra sinfônica
Além do trabalho renovador e consistente, o grupo acumula na bagagem sete turnês nacionais, apresentações em grandes festivais (como a Virada Cultural de São Paulo), uma apresentação ao lado da orquestra sinfônica de Sergipe, além de shows de abertura para artistas como Paralamas do Sucesso, O Rappa, Marcerlo D2, Otto e Mano Chao.
publicado em 24 de setembro de 2013 no Monkey Buzz
Um dos motivos da inconstância do rock nacional de boa qualidade é a incapacidade das bandas e artistas locais em se apropriarem da linguagem americana mestiça original e torná-la o mais brasileira possível. Claro que há formações capazes de emular sonoridades gringas que têm trabalhos de qualidade, mas é sempre mais interessante quando surge alguém que torna o que nasceu lá nos anos 50 do século XX, algo "novamente novo".
Com The Baggios é assim. Oriundos de São Cristóvão, estado do Sergipe, Julio Andrade (guitarra e voz) e Gabriel Carvalho (bateria), já têm certa quilometragem, materializada em alguns EP's e num disco de estreia. Sina é o segundo, lançado neste ano, que já traz uma ousada visão conceitual, além de uma produção de gente grande. Os vocais de The Baggios lembram esses iluminados que fizeram o Rock parecer brasileiro, principalmente Raul Seixas, que, em algumas passagens, parece ter retornado do além para participar. É justamente essa aparência 100% nacional que salva a dupla de parecer uma mera imitadora estética de duos econômicos ruins (White Stripes) e mesmo bons (Black Keys), especialistas em revitalizar as raízes do Rock lá fora.
Destaques absolutos para a abertura com Afro, que serve como uma câmara de descompressão da mesmice e mediocridade reinantes e conduz o ouvinte para um mundo empoeirado, na beira dos trilhos de uma ferrovia que vai do nada para lugar algum, que parece ser o cenário ideal para as aventuras de Sina. Em Esturra Leão, metais e andamento híbrido de xote e rock, dão o caminho pela estrada, enquanto Um Rock Para Zorrão pega pesado no chamado blues primordial e enfia uma bateria pesada pela goela do ouvinte abaixo, para chegar em Domingo, uma balada Seixas-hendrixeana e no andamento que tangencia Creedence Clearwater Revival em Tardes Amenas para chegar no final psicodélico de Descalço.
The Baggios fogem, não só da bundamolice do Rock de matriz clonada de Los Hermanos, como amplia o terreno para novas bandas que desejem saber onde tudo começou, na lama movediça do Blues e, no caso deles, da aridez natal. Sina parece forjado no perrengue, no peito e na raça, com grande resultado. Parabéns a todos os envolvidos.
O regionalismo conceitual do EP “Acústico Aperipê”, novo registro dos The Baggios
Por Jéssica Figueiredo
Oito anos de estrada, shows e prêmios renderam muito para os sergipanos da The Baggios, ao menos no quesito aprendizagem. Não fosse esse tempo sendo banda independente no meio Norte-Nordeste, talvez eles ainda não estivessem prontos para lançar sequer um álbum completo. O tempo acabou agindo a favor da banda, que após lançarem um dos melhores discos de 2011 (homônimo, Vigilante), ganhou reconhecimento nacional e internacional, aparecendo até no inglês The Guardian.
Mas um disco de inéditas, e incrivelmente bem traçadas (com uma faixa levando à outra naturalmente), não faria com que a criatividade e vontade de continuar fazendo música dos sergipanos fosse dissipada. Por isso que os Baggios lançam (hoje) o EP “Acústico Aperipê“, uma reunião de regravações acústicas de músicas que a banda compôs lá em 2004, 2005, com mais dois ou três bônus: canções inéditas e uma bonita homenagem ao homem que inspirou o nome da banda.
Com este novo EP, a The Baggios comprova que o estilo musical norteador da banda, desde o princípio (e que deve perdurar ao longo dos anos), são os astros e estrelas do rock’n'roll anos 60 & 70. Portanto, Rolling Stones, Led Zeppelin e uma pitada de Raul Seixas continuam tomando partido fundamental na sonoridade da banda até mesmo num EP que, seguindo à regra do nome, apresentaria apenas voz, violão e alguns tecladinhos.
Não é rock’n'roll pesado, feito para virar o copo de whiskey e quebrar a guitarra no palco. Mas os bons riffs de guitarras, que muitas vezes lembram grandes canções de blues, não ficam de fora do compacto. Ainda há aquela atmosfera de “bar escuro e esfumaçado” semelhante à criada pelo álbum completo lançado em 2011. Mas a ideia neste EP parece ser a de um blues mais tristonho, melancólico, mas ainda cheio de energia.
O que quebra esta ideia de mais blues e menos rock’n'roll cru são as letras. É aqui que entra a bonita homenagem: The Baggios não fala só sobre o José Sinval, músico andarilho que inspirou o nome da banda . Na verdade, eles parecem fazer um tributo à sua terra natal, Sergipe, recitando versos que descrevem claramente a vida e os costumes do lugar. Este regionalismo, jamais tratado de forma pejorativa, aparece em todo o disco, desde as faixas “Pisa Macio“, “Meu Barato” e “Pegando um Punga” (canções que melhor ilustram a ideia), até projeto gráfico e o título do compacto: “Acústico Aperipê”.
Os músicos usam de vários nomes que, no geral, caracterizam a região deles. Ao final, a sensação é de que esta é uma banda que carrega uma filosofia junkie, um identidade roqueira, mas que não perde o orgulho que tem da própria terra.
Formada em 2004, na cidade histórica de São Cristóvão, Sergipe, a The Baggios tem a peculiaridade de ser formada por apenas dois integrantes: Julio Andrade (guitarra e voz) e Gabriel Carvalho (bateria). Embebidos nas águas turvas e viciadas da música negra, os acordes envenenados da The Baggios misturam ritmos tradicionais, como o Blues , passando pelo rock sessentista e ao garage Rock. A banda tem a embalagem pronta para quem almeja galgar espaços no mainstream: identidade própria, discurso totalmente enraizado com as questões de sua época e de sua gente, e letras que falam diretamente ao público, sem meio termo. O nome surgiu como homenagem a um músico andarilho da pacata cidade, que se vestia de forma esquisita e contava historias surreais nas esquinas.