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Por Cleber Facchi em Miojo Indie
Não existem regras para a banda goiana Boogarins. Se por um lado o embrionário As Plantas Que Curam (2013) parecia se apropriar da obra de veteranos e novatos da música psicodélica, com a chegada de Manual ou Guia Livre de Dissolução dos Sonhos (2015), finalizado dois anos mais tarde, experimentos contidos e ambientações etéreas serviram de estímulo para a construção de uma fina identidade musical. Um som debochado, enérgico e torto na mesma proporção, como se o permanente exercício de descoberta fosse a base para o trabalho produzido pelo grupo.
Prova disso está nas composições do experimental Lá Vem a Morte (2017, OAR). Terceiro e mais recente álbum de inéditas do grupo formado por Fernando “Dinho” Almeida Filho (voz, guitarra), Benke Ferraz (guitarra e sintetizadores), Raphael Vaz Costa (baixo) e Ynaiã Benthroldo (bateria), o trabalho de apenas oito faixas e pouco menos de 30 minutos de duração mostra o esforço do quarteto em se reinventar mesmo em um resumido espaço de tempo. Um “longo EP / curto LP”, como a própria banda apontou no Facebook.
Do momento em que tem início, em Lá Vem a Morte pt.1, o trabalho costurado pelo uso de samples, vozes ecoadas e melodias eletrônicas parece romper com qualquer traço de linearidade e previsão. Como indicado durante o lançamento de Elogio à Instituição do Cinismo, música produzida em parceria com o veterano Bonifrate (Supercordas), cada fragmento do presente disco transporta o ouvinte para um novo cenário. Uma permanente sensação de descrença e incerteza que provoca a audição do ouvinte, conceito reforçado nas projeções e texturas visuais de Rollinos que acompanham a obra.
“Essas músicas são um reflexo da falta de sensibilidade que vivemos. Talvez seja hora de ser forte, jogar a hipocrisia fora e enfrentar os maus e os bons sentimentos ao mesmo tempo. Encontre uma verdade profunda, além da infinita superficialidade de nossos dias”, escreveu o vocalista Dinho no texto de apresentação do álbum. Um direcionamento necessário para a completa apreciação de uma obra que joga com regras próprias. Delírios existencialistas, confissões românticas e instantes de breve descrença, como uma evolução amarga da poesia testada no disco anterior.
São músicas que refletem sobre a padronização dos indivíduos (“Atendem por nomes / Mas no fim são todos iguais”), o fim das coisas e a inevitabilidade da morte (“Eu só tô defendendo uma parada que é pra sempre / E nunca mais volta”), ou mesmo complexas relações pessoais (“Nosso futuro é um furo / Que não é meu / E isso nunca termina”). Uma obra talvez pessimista, porém, claramente sóbria quando voltamos os ouvidos para o mundo de sonhos e pequenos escapismos detalhados nos dois primeiros trabalhos da banda.
Complexo, talvez inacessível na composição dos arranjos, Lá Vem a Morte invade o mesmo território desbravado pela irmã Luziluzia – projeto formado por integrantes da Boogarins e Carne Doce –, em EP 2/3 (autofarra – trilha pra uma festa boa), lançado há poucos meses. Um exercício particular, por vezes confuso quando observado em proximidade ao pop psicodélico de músicas como Avalanche e 6000 Dias. Mesmo Desvios Oníricos (2017), registro ao vivo entregue em fevereiro deste ano, parece longe de repetir a mesma instabilidade. Uma provocativa ruptura com o óbvio, perturbadora em um primeiro momento, porém, necessária para o natural fortalecimento dos versos.
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