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Por Cleber Facchi em Miojo Indie
Que viagem. Durante os mais de 30 minutos de duração de 1943 (2015, Independente), estreia da banda paulista Bike, vozes, melodias e doses consideráveis de distorção se articulam de forma a distanciar o ouvinte da realidade. Como uma verdadeira experiência lisérgica, cada verso ou ruído dissolvido pela obra transporta o espectador para um mundo de sons, cores e emanações cósmicas. Arranjos e letras que mudam de direção a todo o instante, crescendo e diminuindo, como se reações típicas do consumo de LSD fossem transformadas em música.
Com título inspirado no ano em que o cientista suíço Albert Hoffman descobriu o LSD – abril de 1943 -, e deu uma volta de bicicleta ao tomar a primeira grande dose da substância, cada uma das oito faixas que marcam a estreia do Bike se projetam com pequenas viagens. Sem necessariamente perder o caráter homogêneo das canções – sempre próximas, como se tudo não passasse de um mesmo ato instrumental -, o grupo parece brincar com a mente do ouvinte, dançando em meio a reverbs, distorções e solos de guitarra que explodem a todo o instante.
Nos versos, o mais completo delírio. Músicas que relatam experiências cósmicas, falam sobre o amor e até temas existencialistas. “Arco-íris distorcem a minha visão / Me guiando à outra dimensão / E amanhã será um belo dia / Outra tarde de psicodelia”, canta o vocalista Julito Cavalcante na mágica Alucinações e Viagens Astrais, música que resume toda a estrutura montada pela banda ao longo do disco.
Ainda que lembrar de Beatles, Tame Impala e outros gigantes da música psicodélica seja um ato natural no decorrer do álbum, muito do que orienta a estreia do Bike parece ancorado em conceitos e distorções típicas do Shoegaze / Rock Alternativo da década de 1990. Basta voltar os ouvidos para os antigos projetos de boa parte dos integrantes da banda – completa com Diego Xavier (guitarra e voz), Gustavo Athayde (bateria e voz) e Hafa Bulleto (baixo e voz) -; grupos como Sin Ayuda e The Vain, que conseguiram relativo destaque no meio independente no começo da presente década.
Logo na abertura do disco, a dobradinha composta por 1943 e Enigma do Dente Falso reforçam essa inevitável associação com o passado. Difícil não lembrar de grupos como Ride e Slowdive quando as vozes abafadas e batidas tentam escapar da avalanche de temas sujos lentamente incorporados pelas guitarras. A relação com a música dos anos 1990 ainda volta a se repetir em faixas densas como A Vida é uma Raposa e Luz, Som & Dimensão, composições escolhidas pela banda para encerrar o disco e uma espécie de diálogo com a obra do grupo norte-americano The Flaming Lips no mesmo período.
Embora constante, a relação da banda com o passado está longe de parecer um problema durante a execução da obra. Trata-se apenas de uma fina tapeçaria referencial, uma espécie de tempero para o conjunto de experimentos delicadamente incorporados em cada música. De fato, poucos grupos recentes conseguiram reproduzir um trabalho tão dinâmico e atual quanto o Bike em 1943. Da avalanche de ruídos ao uso de versos marcados pela leveza – “Vulcões cospem fogo e as geleiras derretem / Resolvemos os problemas do mundo e eles se repetem” -, é fácil ser seduzido e hipnotizado pelo som do grupo.
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