segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Depois das críticas as edições regidas pelo voto do público, Prêmio Multishow e VMB restrigem participação da audiência

RIO - RIO - Os organizadores de duas das maiores premiações da música brasileira resolveram pisar no freio da interatividade virtual. Em suas últimas edições, todas as categorias do Prêmio Multishow e do VMB, da MTV, foram decididas por votação popular via internet, e houve um quase domínio de grupos adolescentes cujos fãs-clubes se mobilizaram para dar uma coleção de troféus aos ídolos do "rock colorido".
As premiações, então, receberam um derrame de críticas - muita gente considerou que eleger Restart e Cine como as melhores bandas do Brasil não refletia o panorama da música atual. Mas, em 2011, ambos os eventos voltam repensados, confiando em júris de especialistas para contrabalançar o jogo de poderes e transformar, ao menos em parte, o perfil dos vencedores.
Pela primeira vez em 18 anos do Prêmio Multishow, que acontece nesta terça-feira, na Arena HSBC, na Barra da Tijuca, a decisão de quem são os "melhores da música" não estará só nas mãos do público. Está certo que todas as 12 categorias foram abertas ao voto popular, mas cinco delas também terão versões definidas por um corpo de jurados (melhores Cantor, Cantora, Música e Grupo, além da Experimente). O Restart continua em destaque, com oito indicações do público, mas, na seara do júri, as apostas são artistas elogiados pela crítica, como os cantores Marcelo Camelo, Marcelo Jeneci e Tulipa Ruiz. Já no VMB, que acontece dia 20 de outubro, a mudança é bem mais radical: só quatro dos 11 premiados serão escolhidos pelo povo, e o Restart não recebeu nenhuma indicação.

- Ficávamos incomodados de, todo ano, os mesmos artistas serem eleitos. Os fã-clubes de bandas como Restart e NX Zero sempre se organizam para votar em massa, e fica impossível para novos talentos competirem. Como resultado, bandas ótimas como Mombojó, Sabonetes e Móveis Coloniais de Acaju ficavam de fora. Nossa intenção foi promover um maior equilíbrio de forças - explica Guilherme Zattar, diretor do canal Multishow.

A premiação de terça ainda enfatiza a vontade do público, o que é marca do evento desde o início. Mas o canal acredita que os nomes do júri devem oxigenar a competição. No ano passado, o evento foi alvo de protestos e ironia nas redes sociais e nos sites especializados depois de entregar os troféus mais cobiçados da noite a nomes teen como Restart (melhor Música), Cine (melhor Banda) e Luan Santana (Revelação).

O VMB foi motivo do mesmo tipo de vaia em 2010, quando o Restart faturou cinco dos 14 prêmios, graças a suas centenas de milhares de seguidores no Twitter. Por isso mesmo, a MTV decidiu pegar as rédeas da situação e, nesta 17ª edição, o público só pode votar nas categorias Webclipe, Webhit, Hit do Ano e Artista Internacional. Além disso, todos os concorrentes foram escolhidos por uma "academia" de cem jurados, e a lista de indicados está cheia de artistas como o rapper Emicida e as bandas indie Copacabana Club e Mombojó.

- O VMB não é uma premiação popular. O que vale para nós é o olhar da MTV sobre a música brasileira, e estávamos nos afastando disso. A premiação também não representava mais a realidade, pois as bandas adolescentes engoliam as outras com a votação maciça dos fãs, que passam o dia conectados. Mas o VMB não é o prêmio da Restart - resume o diretor de programação da MTV Brasil, Zico Goes.

Na leitura da crítica especializada, as últimas premiações não refletem a paisagem nacional, e nem mesmo a orientação dos canais. Tanto Multishow quanto MTV buscam, em boa parte dos seus programas, ser referência de qualidade musical, e não apenas vitrine para os artistas com mais público. Editor-chefe da revista "Rolling Stone" Brasil, Pablo Miyazawa é jurado do VMB e do Prêmio Multishow. Ele vê essas mudanças de posição como uma busca por credibilidade:
 - A imagem dos prêmios se desgastou nos últimos anos, desde que as redes sociais se tornaram um espaço altamente crítico. O público que não curte as bandas adolescentes vê os resultados do voto popular apenas como uma representação da quantidade, e não da qualidade dos ganhadores - observa o jornalista.
De acordo com Zico Goes, o objetivo da MTV é filtrar e lançar tendências, e convocou para seu quadro de VJs, este ano, nomes como China, Chuck Hipolitho e, mais recentemente, o rapper Emicida. Todos nomes respeitados da cena musical.

- Hoje, na MTV, existe até um toque de recolher para bandas teen. A partir das 20h, esses grupos não aparecem mais na programação. Não queremos ser um canal só para adolescentes - afirma Zico.
Um dos pivôs dessas mudanças, o guitarrista Pedro Lucas, o Pe Lu, do Restart, sabe que é difícil para outras bandas competirem com o exército de fãs que votam sem parar, incentivado pelos próprios ídolos. Apesar disso, ele considera a reação exagerada:
 - Fico triste de não participar (do VMB), mas acho legal ver esse espaço para outros artistas que adoro, como o Marcelo Camelo e a banda CW7 - diz o músico, antes de criticar: - Os prêmios entregues por um júri retratam o gosto de poucas pessoas. A música nacional é mais abrangente do que a opinião de um grupo seleto.

Pelas redes sociais, já se pode ver algumas reações às mudanças. Muita gente lamentou perder a chance de votar em seus ídolos (no caso do VMB). Mas pessoas ligadas ao universo fonográfico elogiam.

- Um prêmio deve ser dado por pessoas que entendem do assunto e têm senso crítico. Voto popular é outra coisa. As premiações gringas, como a do semanário britânico "NME", destacam nomes que merecem atenção. Aqui, as listas de vencedores têm sido irrelevantes - diz o produtor musical Pedro Seiler, que trabalhou no último CD de Chico Buarque e é um criadores do projeto Queremos, que promove shows no Rio viabilizados por crowdfunding.

Para o jornalista José Emilio Rondeau, autor do livro "Sexo, drogas e Rolling Stones" (Agir), a oportunidade para bandas novas se destacarem aumentou:
- Os especialistas em música poderão apresentar novos sons aos espectadores e isso é saudável, pois amplia o conhecimento musical de quem está vendo.
 por: Maria Cohen, Agência O Globo

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