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Por João Luiz Sampaio
Voltar às origens, no caso de Leo Gandelman, é antes de mais nada lembrar daquelas manhãs de sábado e domingo nas quais, ainda menino, era acordado pela música que vinha da sala, onde a mãe tocava com amigos ou trabalhava com seus alunos; o pai, o maestro Heinrich Gandelman, também ajudava a fazer da música presença constante. E não por acaso Leo descreve os momentos musicais como os mais especiais de sua infância. Momentos dos quais não participava apenas como ouvinte. O piano ele estudoudesde pequeno, mas não só. Com a flauta doce, foi solista da Sinfônica Brasileira aos 15 anos – e, em um conjunto dedicado à música barroca, tocou até viola da gamba.
A carreira de concertista parecia o caminho natural – mas, talvez pela rebeldia da adolescência, ele acabaria em outras paragens. Leo foi fotógrafo, trabalhou com cinema. Até que a música o chamou de volta, agora com o saxofone. Foi para os EUA, estudou composição em Berklee. Voltou ao Brasil no final dos anos 70, dedicando-se ao jazz e à música instrumental – e o resto é história: ou melhor, um dos capítulos mais marcantes da história da música brasileira. Como arranjador, produtor e saxofonista trabalhou em mais de 800 gravações, além dos onze discos solo, gravados a partir do fim da década de 80, que levam a algo como 500 mil cópias vendidas durante a carreira.
O passado clássico parecia adormecido quando, em 1999, ele recebeu um convite do maestro Silvio Barbato, então à frente da Sinfônica do Teatro Nacional de Brasília: ser solista da “Fantasia para Saxofone e Orquestra”, de Villa-Lobos. Projetos dos anos seguintes – e o desejo do intérprete de continuar se aventurando por este repertório – são talvez o melhor testemunho do sucesso da empreitada. Leo passou a atuar como solista ao lado de grupos como a Sinfônica do Estado de São Paulo e a Petrobrás Sinfônica, com a qual inclusive gravou o “Concertino” de Radamés Gnatalli, regido por Isaac Karabtchevsky. Estabeleceu ainda parceria com as pianistas Estela Caldi e Maria Teresa Madeira, com quem formou um duo regular que lhe permitiu trabalhar sistematicamente o repertório clássico para saxofone e piano.
Levando tudo isso em consideração, é possível entender “Origens” de duas maneiras distintas, que dialogam entre si: o disco é ao mesmo tempo o retrato privilegiado do recente trabalho do artista e uma volta à sua origem na música. Leo selecionou para o álbum compositores fundamentais da música de concerto brasileira no século 20 – Villa-Lobos, Ernesto Nazareth, Chiquinha Gonzaga e Radamés Gnatalli –, além do francês Jacques Ibert. Além do momento histórico, há uma característica comum que os une de maneira particular: a liberdade com que trabalharam os mais diferentes materiais musicais na criação de suas obras, desde elementos do folclore e da música popular até os principais gêneros da tradição musical ocidental.
Transitando ele também, ao longo da carreira, entre o erudito e o popular, é tentador definir Leo Gandelman como o intérprete ideal dessas obras. O raciocínio, em si, não está equivocado – e a experiência musical do artista com certeza o prepara de maneira especial para esse repertório. Mas a excelência de sua interpretação tem outras e mais importantes justificativas. A construção sensível das linhas melódicas no Villa-Lobos; o virtuosismo que jamais abre mão da musicalidade no Ibert; a construção das atmosferas musicais da “Brasiliana” de Gnatalli; a musicalidade solta e envolvente em Nazareth e Chiquinha Gonzaga – todos esses elementos mostram conhecimento da partitura, da linguagem específica de cada autor e, acima de tudo, a capacidade de dialogar com elas de modo extremamente pessoal. Acima de qualquer rótulo, é isto, afinal, que se espera do grande artista – e que dá a ele a capacidade de reinventar o repertório a que se dedica.
1. Fantasia Para Saxofone Soprano
2. Concertino Para Sax Alto
3. Brasiliana 7
4. Quatro Canções Da Floresta Do Amazonas
5. Brejeiro
6. Gaúcho (Corta-Jaca)
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