Por Tribuna do Norte
Quando adolescente, 12 ou 13 anos, Alexandre Caparroz se escondia todas as sextas-feiras, às 23 horas em ponto, para sintonizar na TV Record. Sem som - para não ser descoberto pela mãe e as irmãs - ele assistia à sessão Sala Especial. Agora, é curioso que a homenagem do músico e produtor à seleção de filmes safadinhos, ingênuos e, por que não?, transgressores seja justamente uma trilha sonora fictícia para as chamadas pornochanchadas -Sexy 70 (YB Music).
Música que ouviu baixinho, mas que marcou - não só ele, mas toda a geração. Lá pelo início dos anos 80, ditadura ainda de pé, deusas como Helena Ramos, Matilde Mastrangi, Aldine Muller e Vera Gimenez desfilavam na TV de calcinha e sutiã em filmes que começaram a ser produzidos na década de 70. Entre beijos e provocações de galãs heavy metal como Paulo César Peréio, Raul Cortez e Nuno Leal Maia, se deixava ver um seio - um de cada vez, a mando dos censores; e um naco de bunda - ela toda, jamais.
Mas valia a pena: na segunda-feira, o filme apresentado na Sala Especial era o assunto que dominava as rodinhas dos meninos nas escolas por aí. "Era uma semana inteira esperando para ver pelo menos um peito", lembra Caparroz, o Che. "Naquela época, não tínhamos videocassete. Então, tudo era totalmente restrito à TV aberta e não havia nada parecido com a Sala Especial. Hoje em dia, tem peito fácil, no horário nobre."
De início, a idéia de Che era fazer uma pesquisa e regravar as músicas originais dos filmes. "Descobri que não havia fonogramas, as músicas só estavam nos filmes, não foram gravadas numa trilha sonora, como a gente vê hoje", explica. "E os filmes não tinham temas musicais muito definidos, era tudo meio desordenado. Não é como somos acostumados hoje. Dá a impressão de que as músicas eram feitas às pressas, ainda que muitas tenham qualidade."
Se era impossível resgatar a trilha original, Che partiu para a ficção. E com Mulher Objeto (de Silvio de Abreu, 1981) na cabeça, o seu preferido, recriou o clima musical dos filmes com capricho. "Aquela sonoridade dos filmes era muito específica da época, por causa dos instrumentos, da evolução tecnológica. Eram os tempos dos pianos elétricos, se usava muito órgão, arranjos ainda muito orquestrados", observa Che.
"E as trilhas das pornochanchadas se inspiravam muito nas comédias italianas, (Henry) Mancini, por exemplo."
Em Sexy 70 - que tem o hilariante subtítulo Music Inspired by The Brazilian Movies of the 1970's - Che toca praticamente todos os instrumentos. E de um jeito retrô autêntico, traz de volta o pai do easy listening, do lounge. Música boa de ouvir e trilha perfeita para certas ocasiões, digamos, especiais.
"Como não sou da música eletrônica, tentei fazer o mais acústico possível", diz. "O disco é bastante tocado, usei poucos samples, só alguns timbres."
O disco é todo instrumental, mas tem as participações arrasadoras de Helena Ramos e Peréio, que entram com textos rasgados, despudorados - e alguns gemidos, claro.
Ela, ainda com voz de veludo, sussurra na apresentação das 17 faixas: "Sexy 70, o seu prazer é nosso". Os textos, à moda dos filmes, foram criados por Che. "Sobe aí, que eu te levo para tomar um sorvete", provoca Peréio. Os nomes das músicas são títulos de pornochanchadas - Mulher Objeto - ou inspirados nelas - Um Grapete Antes, Um Cigarro Depois, homenagem a Um Uísque Antes, Um Cigarro Depois.
Criada na Boca do Lixo - onde hoje está instalada a "cracolândia", no centro de São Paulo -, a pornochanchada foi mais do que enxovalhada pelos intelectuais de plantão. Mesmo sob protestos e o olhar atento dos censores da ditadura, conseguiu produzir uns 600 títulos, que mesclavam picardia, peitinhos (sem silicone) e boa dose de humor para contar histórias de adultério, amor, loucuras mil. Comparados aos pornôs de hoje, soam ingênuos.
"Genitália, nem pensar. Bunda não podia aparecer inteira. Mas a gente contornava a legislação - e os filmes tinham muito tesão", lembra Peréio. "A Embrafilme era muito voltada para o Rio e não distribuía os filmes. Aqueles filmes eram muito rejeitados por serem feitos em São Paulo."
Modelito à la cafajeste, com bigodão descaradamente falso, Che prepara agora os shows do disco. Terá banda e três músicas cantadas - Rio Babilônia já é certa. "A proposta vale por causa do humor mesmo. Não tinha pretensões comerciais, fiz pelos amigos", diz. "Para quem tem mais de 30 anos, fica essa lembrança."
2.Helena x Aldine
3.A babilônia de David
4.Desejos ardentes
5.Vinheta
6.Pixoxó em lua de mel
7.Vera, a diaba loira
8.Simplesmente Glória
9.Mulher objeto
10.Um Grapete antes, um cigarro depois
11.O eterno pecado horizontal
12.Suite para Peréio
13.Sala especial
14.Tá tudo errado porra!
15.Pixoxó remix
16.Babilônia dub version
17.Ainda te pego (bônus track)
Caro Tarkin, ri demais com este post. Voltei a minha querida infância, assistindo Sala Especial da Record. E me lembro muito bem, das cenas, da Nadia Lippi, do John Herbert e também da Vera Fisher com uma pinta no seio (ela tirou depois). Já passaram uns 30 anos mas parece que foi ontem.
ResponderExcluirO seu post, além de divertido, traz um pouco da história daquela época e isto foi muito legal. Era um outro clima...
Cara, obrigado também por mencionar o meu querido Valvulado.
Um grande abraço
Coloquei um link de volta pra cá, no post.
Excluirabraços
Valeu. Legal essa troca de figurinhas. Abs.
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