Publicado originalmente em 3 de maio de 2012 no Sete Doses de Cachaça
Fui à lojas de discos de vinil. Para ser mais exato, em cinco lojas, cinco sebos. Achei legal ver em todas elas discos de rock brasileiro expostos ao lado de clássicos estrangeiros. The Jet Black's, O'Seis, Renato e Seus Blue Caps, Rita Lee. E até coisas mais obscuras e underground como Os Brazões, Flaviola e o Bando do Sol, Bixo da Seda, Ave Sangria e Módulo 1000. Um resgate muito importante. Isso me parece que tem um empurrão causado pelo interesse de europeus, americanos e japoneses. David Byrne, Kurt Cobain, Belle e Sebastian, Beck citam influencias da música brasileira.
Cresci com meus pais escutando de tudo: Serge Gainsbourg, Frank Sinatra, Willie Nelson, Rolando Boldrin, Alvarenga e Ranchinho, Tonico e Tinoco, Chico Buarque, Maria Bethânia, Soul Music, Glenn Miller, Duke Ellington, Elis Regina, a cena de San Francisco, soft rock, Gilberto Gil. Um monte de coisas (bossa novanão!).
Dos anos 1980 o melhor eram os shows, por causa do som que, mesmo sendo ruim, era melhor do que estava em disco. Até o final dos 1980 poucas bandas conseguiram gravar discos com ótima qualidade sonora. Por isso, o que acontece é de pessoas redescobrindo discos dessa época e quando vão escutar rola uma decepção. Já escrevi sobre isso por aqui. Aí nos anos 1990, por conta de tanta novidade vinda do Reino Unido e EUA como a cena eletrônica, Madchester, Grunge, Britpop, quem estava formando sua banda, acabou indo direto para essas influências, principalmente as duas últimas cenas citadas.
Durante toda a década de 1980 os jornalistas que escreviam sobre música faziam questão de deixar claro o preconceito. Pela economia, pela política, a cultura sofreu um baque no final dos 1980 e início dos 1990. Muitos dos que estavam começando, não vendo futuro aqui, compunham em inglês. Bandas cantando em português só ressurgiram junto com o Real, em 1994. O Raimundos com forró, o Skank com Clube da Esquina, O Rappa e Planet Hemp com o samba dos morros e da Lapa, a malandragem carioca e CSNZ o Maracatu.
Mas acredito que o pontapé inicial do que se tornou hoje a influência da música brasileira mais antiga nos trabalhos de bandas e artistas solos foi o aparecimento do Los Hermanos. Queira ou não a banda resgatou o samba, a bossa nova e também um pouco da mpb dos anos 1970. Particularmente eu não gosto, mas não posso negar essa influência.
As bandas do Rio Grande do Sul sempre tiveram forte influência da Jovem Guarda, Marcelo D2 o samba, tem uma nova geração que é mais ligada na Tropicália e na mpb70. É nítido isso em quem faz rock com mpb e vice versa. Os gringos mostraram interesse e isso fez despertar a curiosidade dessa geração surgida com LH e que agora vai mais longe na busca pelos artistas e discos mais raros, como quem diz "quem é você gringo que quer saber mais que eu, que sou brasileiro."
Também conheço algumas bandas que mesmo sendo 100% rock, citam Clara Nunes, Noel Rosa, Ney Matogrosso, Vinícius de Moraes. É bom ver essa valorização, mas digo sem querer ser nacionalista. Nada disso. Sou roqueiro, ultra fã de ingleses e americanos. Só que também valorizo tudo isso, pesquiso desde 1997 e muitos discos que eu não tinha acesso na época consegui através da internet, principalmente, nos 10 últimos anos. Mas essa influência não se restringe só a bandas do underground dos 1960 e 1970. Tem também os nomes ditos marginais como Arnaldo Baptista, Itamar Assumpção, Jards Macalé, Tom Zé, Sérgio Sampaio.
Em todas essas lojas eu vi gente garimpando, incluindo alemães e japoneses. Mas pra você que quer achar pérolas a dica é não ir nesses sebos mais conhecidos. Há lugares que sabem colocar o preço, mas há lugares que não, principalmente em pequenos sebos de bairros, digamos, menos comerciais e mais residenciais. Hábrechós com discos, mesmo que poucos. Já achei muitas coisas boas em lugares mais especializados em objetos antigos e roupas usadas, e com pouquíssimos e ótimos discos vendidos por 3, 5, 10 reais no máximo.
Mas fato é que durante muitos anos nos 1990, 90% das bandas ignorava a música brasileira e só depois que a nova cena estourou em 1995 é que um monte de bandas que cantavam em inglês passaram a amar Jackson do Pandeiro e Tom Zé. Nessa época aqueles que mostravam gosto pelo rock brasileiro, mpb, forró, chorinho e até mesmo Tropicália eram escrachados pelos "grunges" e "alternativos", que com o fim dessas cenas, passaram a admirar exatamente do que antes riam e depreciavam.
Por isso hoje é bom ver que as novas gerações não tem vergonha e preconceito da música brasileira, pelo contrário, hoje são influências assumidas e a garimpagem por títulos raros vai além do colecionismo, também é expectativa de que possa se tornar uma nova influencia. Lembro, por exemplo, de escutar Loki?em 1987, com 17 anos e a cabeça rodar com o que pra mim era novidade. Em poucos dias estava eu com todos seus discos solos comprados, e por um preço baixo, já que na época ele estava completamente esquecido. Hoje as coisas mudaram. Vai achar o Build Up da Rita Lee. Quase impossível, e ainda pode chegar a 350 reais.
Hoje, eu que fiz parte da turma dos 1990 que tomava porrada por gostar de mpb, tenho a alma lavada de ver que esse preconceito que escrevi aqui acabou. Agora, se essas influencias são bem ou mal usadas, isso é outra história.
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